Versão eletrônica do real deve ser lançada até
2024, estima assessor do Banco Central
O Brasil deve lançar a versão digital do real até 2024. A estimativa é
de Fábio Araújo, assessor econômico do Banco Central que coordena os estudos
para a implantação da moeda eletrônica. Araújo participou de uma audiência
pública na Comissão de Ciência e Tecnologia (CCT) nesta quarta-feira (1º).
— Teremos testes iniciais em 2022. Dada a complexidade, esse não é um
problema que vai ser resolvido nos próximos meses. O horizonte de dois ou três
anos parece um prazo mais adequado para que as condições para a eventual
emissão de um Real digital estejam maduras — afirmou.
O presidente da CCT, senador Rodrigo Cunha (PSDB-AL), disse o Banco
Central precisa avaliar vantagens e desvantagens do novo serviço. Para o
parlamentar, a moeda eletrônica poderia aumentar a eficiência do sistema
monetário nacional.
— É indispensável examinar quais vantagens e eventuais desvantagens da
criação da moeda digital. Entre os benefícios, o Real digital seria uma moeda
de troca praticamente sem custo, o que ajudaria a aumentar a eficiência do
sistema de pagamentos e facilitaria a liquidação mais rápida e segura das
transações financeiras internacionais. Micro e pequenos negócios também
poderiam se beneficiar com a diminuição de custos de transações. Por outro
lado, por ser rastreável, a moeda digital também auxiliaria no combate aos
crimes de lavagem de dinheiro, corrupção, sonegação fiscal, trafico de drogas e
terrorismo — argumentou Cunha.
O dinheiro digital já existe em outros países, como uma versão virtual
da moeda oficial de cada nação. Oficialmente, ela é chamada de CBDC — sigla
para Central Bank Digital Currency (Moeda Digital Emitida por Banco Central, em
português). O serviço é usado para realizar compras e investimentos, estipular
valor de produtos e outras finalidades. Fábio Araújo explica que a CBDC
brasileira não pode ser confundida com um criptoativo privado, como o Bitcoin.
— O Banco Central mantém sua opinião de que os criptoativos são
especulativos e trazem aletos riscos para as carteiras dos indivíduos. A CBDC é
simplesmente uma expressão do real normal, o real físico que você já usa no seu
dia a dia — disse.
De acordo com o assessor, o e-Real seria emitido pelo próprio Banco
Central e distribuído oficialmente pelo sistema financeiro para operações como
pagamentos no varejo, além do fomento a novos modelos tecnológicos.
— O principal objetivo seria acompanhar o dinamismo da evolução
tecnológica da economia brasileira para contribuir para o surgimento de
negócios. Também vai permitir que a gente aumente a já grande eficiência do
nosso sistema de pagamentos e favoreça a participação do Brasil no cenário
econômico regional e global. Com isso, o Banco Central teria uma ferramenta
para cumprir as suas missões de estabilidade monetária e financeira numa
economia que é cada vez mais digital — afirmou.
Para o professor Eduardo Henrique Diniz, pesquisador do Centro de
Estudos de Administração Pública e Governo da Fundação Getúlio Vargas (FGV), o
movimento do Brasil em direção à CBDC pode ter sido influenciado pelo
lançamento de moedas digitais por empresas privadas. Ele citou o caso do
Facebook, que prevê o um sistema de pagamentos baseado na criptomoeda Diem
ainda em 2021.
— O Facebook é uma empresa que tem quase três bilhões de usuários pelo
planeta. Se essa moeda é adotada em larga escala, vamos ter um tipo de sistema
financeiro controlado por uma empresa privada, que não tem uma fiscalização com
mecanismos democráticos que o Estado tende a ter. O lançamento do real digital
tem a ver com a perspectiva de o Estado tomar as rédeas e o controle do sistema
monetário. Do jeito que as grandes empresas de tecnologia estão avançando, há
um risco muito grande de esse controle ficar na mão dessas empresas — analisou.
O coordenador de Sistemas Financeiros do Ministério da Economia, Daniel
Gersten Reiss, também participou da audiência pública. Ele lembra há 20 anos os
pagamentos digitais respondem por mais de 96% do mercado monetário brasileiro.
— O real já é digital. Dando um exemplo pessoal, desde o início da
pandemia eu não saquei uma única cédula, uma única moeda de real. Os cartões de
pagamento, o internet banking e mais recentemente o Pix acabam por atender boa
parte das necessidades de pagamento e guarda de valores das pessoas — disse.
A professora Dora Kaufman, do Programa de Tecnologias da Inteligência da
Pontifícia Universidade Católica (PUC) de São Paulo, confirma que as transações
digitais já são predominantes no Brasil. Mas alerta para os cuidados que as
instituições financeiras devem ter com a segurança e a privacidade dos
usuários.
— O papel moeda praticamente já não existe em alguns países. Nosso
ambiente já é digital e temos uma sociedade conectada. A grande questão desse
processo de digitalização é a segurança dos dados. O papel moeda é uma
transação anônima. Não tem identificação das partes envolvidas. Com uma moeda
digital, há identificação e geração de dados. A privacidade desses dados é
básica — afirmou.
O diretor de Inovações da Federação Brasileira de Bancos (Febraban),
Leandro Vilain, avalia que o CBDC brasileiro atravessa um “estágio muito
inicial”. Questionado pelo senador Rodrigo Cunha (PSDB-AL), Vilain analisou os
potenciais riscos envolvidos na emissão de uma moeda digital no Brasil. Para o
representante da Febraban, eventuais crimes financeiros que venham a ser
cometidos na plataforma eletrônica não podem ser tratadas como um problema
específico da moeda virtual.
— Quando você tem um participante que está à margem da regulação e da
legislação, isso passa a ser um problema criminal. Não está ligado de nenhuma
forma à tecnologia utilizada. As “pirâmides” sempre aconteceram. Não só no
Brasil, tem casos escandalosos nos Estados Unidos — argumentou.
Agência Senado
(Reprodução autorizada mediante citação da Agência Senado)
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